Quais os cuidados você deve ter ao elaborar, ou avaliar, um fluxo de caixa projetado? Lembre-se que são dessas projeções que saem o valor das empresas.
Bem, muitas são as críticas a subjetividade nas projeções do fluxo de caixa para determinar o valor de uma empresa, pois elas dependem do viés cognitivo do analista além de cenários futuros que podem se confirmar ou não. Mas muitos dos riscos destas projeções podem ser minimizados por uma criteriosa avaliação.
Analisando o Valor Empresarial: A Abordagem do Fluxo de Caixa Descontado
O modelo mais utilizado para se encontrar o valor de uma empresa é o chamado fluxo de caixa descontado que nada mais é do que projetar a capacidade de geração de caixa de uma empresa no futuro trazendo a valor presente descontado pelo seu risco.
Essa geração de caixa é o que chamamos de fluxo de caixa Livre, resultado do somatório do fluxo de caixa operacional mais o fluxo de caixa de investimentos encontrados pelo modelo:
O EBITDA é o lucro antes dos juros, dos impostos, da depreciação e da amortização, dele deduzimos a depreciação e a amortização para calcular o imposto de renda e retornamos para achar o fluxo de caixa operacional já que depreciação e amortização não tem efeito no caixa e aqui só foi utilizado para efeitos fiscais, em seguida projetamos os investimentos em bens de capital chamados de capex, que a sigla de “capital expenditure” e calculamos as variações na necessidade do capital de giro, o resultado final é um fluxo de caixa livre que vamos utilizar para encontrar o valor da empresa.
O que eu quero chamar atenção neste modelo é o risco escondido por trás destas projeções. O fluxo de caixa operacional é o EBITDA e o fluxo de caixa dos investimentos são os investimentos em bens de capital e em capital de giro. Quem avalia a empresa olha o EBITDA por que é a geração de caixa operacional.
Simplificando, é o que a empresa gera com o seu negócio, desconsiderado aí a geração de caixa não operacional e financeira. Por exemplo: a empresa resolve vender um imóvel de uma filial qualquer, essa receita estará contabilizada como receita não operacional porque ela não foi gerada pelo negócio, além de ser uma receita não recorrente.
Riscos Financeiros Ocultos: O Caso Ilustrativo das Receitas Futuras da Sadia
Outro exemplo bem mais didático são as receitas financeiras, e temos um exemplo clássico na nossa história corporativa recente. Empresas que obtiveram durante vários anos receitas com operações no mercado futuro de dólar, iniciadas a princípio como operações estruturadas de proteção e que por terem sucesso foram repetidas diversas vezes, cada vez em volumes maiores que o necessário para essa proteção, para gerar receitas financeiras, e terminaram muito mal quando veio a crise do subprime.
Você deve se lembrar do prejuízo de mais de dois bilhões de dólares que a Sadia amargou por ter enormes posições vendidas em dólar quando estourou a crise.
Trago este exemplo porque, apesar da última linha da demonstração de resultados do exercício da Sadia apresentarem excelentes números, a do lucro líquido, óbvio que alegrava muito os seus acionistas, estes resultados, em sua maioria, não estavam vindo do negócio da empresa e sim de receitas financeiras obtidas nestas operações no mercado futuro de dólar.
Concentrece-se no Caixa Gerado pelo Core Business e Investimentos Alinhados ao Crescimento Operacional
Resumindo, ao avaliar uma empresa o que interessa é o caixa que ela consegue gerar com o seu “core business”. No caso da Sadia, vender alimentos, e não operar o mercado futuro de dólar. Se até grandes bancos quebram realizando essas operações, imaginem empresas não financeiras.
Considerando então somente o fluxo de caixa operacional, para que ele aconteça é necessário um fluxo de caixa de Investimentos, que precisa ser em volume suficiente para garantir o crescimento projetado.
Por exemplo, uma empresa de siderurgia que não tenha capacidade produtiva ociosa e projete um crescimento nos próximos anos, ela precisará considerar no seu fluxo de caixa de investimentos não só a manutenção da sua estrutura atual como o seu aumento, seja em construção de novas estruturas, seja na compra de novos equipamentos industriais, e eles precisam estar proporcionalmente em linha com a sua projeção de crescimento operacional.
Equilibrando Prazos e Recursos: Desvendando a Necessidade de Capital de Giro nas Empresas
Além desses investimentos no chamado “capex” é necessário considerar a variação na necessidade de capital de giro.
Aqui cabe uma explicação mais didática.
Capital de giro é aquela necessidade que a empresa tem na defasagem de prazo entre pagar seus fornecedores e receber dos seus clientes, considere que funcionários também são fornecedores, pois fornecem mão de obra.
Esta diferença entre o que a empresa tem no contas a receber e estoques e o contas a pagar e salários é a sua necessidade de capital de giro. Intuitivamente você já deve imaginar a quantidade de empresas que passam por essas dificuldades. A folha de pagamento dos funcionários e a fatura dos fornecedores vencem e a empresa ainda não conseguiu transformar o contas a receber em caixa, e nem o estoque em vendas.
Para enfrentar este descasamento de prazos, encontramos a necessidade de capital de giro da empresa, que nada mais é que a diferença entre essas contas do ativo – contas a receber e estoques, menos as contas do passivo – fornecedores e salários. Esse valor encontrado deve ser investido no caixa como capital de giro e deve ficar intocável, pois está lá para isso.
A Importância de Antecipar Crescimento no Caixa Operacional, Investimentos em Capital e Necessidade de Giro
Voltando as projeções, se a empresa projeta um crescimento, sua necessidade de capital de giro também deve aumentar, afinal crescimento de vendas pressupõe mais crédito, e mais estoques, então essa necessidade vai variar e deve estar prevista como forma de mais investimentos em capital de giro.
Enfim, ao avaliar as projeções futuras no fluxo de caixa de uma empresa atente-se para estas três variáveis, o crescimento no fluxo de caixa operacional, esqueça o lucro líquido, se as suas projeções de investimentos em bens de capital suportam o crescimento projetado, seja em manutenção, seja em novas estruturas e equipamentos, e se suas variações na necessidade de capital de giro atendem as projeções no crescimento das suas vendas.
Então, ao avaliar projeções, foque em três coisas: o crescimento do dinheiro gerado pelo negócio principal, se os investimentos para esse crescimento fazem sentido e se as variações nas contas a receber e estoques acompanham o crescimento das vendas.
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